sexta-feira, 23 de maio de 2008

IXXº Encontro Nacional de Mestres Alfaiates em Belmonte

Em Portugal, já há cidades sem alfaiate e dentro de 20 anos a arte terá desaparecido de uma forma geral, prevê Carlos Godinho, organizador do 19º Encontro Nacional de Mestres Alfaiates, que se realiza domingo, em Belmonte. "Hoje não deve haver mais de dois mil em todo o País e não há quem aprenda a profissão", aponta o vendedor de tecidos da Guarda, com o conhecimento que tem do sector, fruto de 46 anos de viagens por todo o País a fornecer alfaiates. "Diria que os alfaiates mais novos devem ter uns 40 anos de idade e se houver 20 ou 30 nessa faixa etária é muito. Por isso eu digo: daqui por uns 20 anos já não há alfaiates em Portugal", prevê. Admite que possa restar uma minoria, de entre os que trabalham para as classes altas. "Hoje, talvez 40 por cento dos alfaiates consigam fazer alguma coisa para clientes abastados", ou seja, "fatos com preços a partir dos 750 euros". O resto "tem pouco que fazer, porque trabalha para a classe média, que não já tem dinheiro para ir ao alfaite, nem para fazer um dos fatos mais baratos", com preços a partir de 120 euros.


HOJE ANDA TUDO DE CALÇAS DE GANGA

"Há uns anos, toda a gente tinha o seu fatinho. Hoje anda tudo de calças de ganga". Carlos Godinho reconhece que as leis de mercado estão a ditar a extinção dos mestres alfaiates, mas ao mesmo tempo queixa-se da falta de apoios do Estado.
"Nunca se criaram escolas para ensinar esta arte, nunca se criou um estatuto para o alfaiate, por exemplo, como artesão. Deixaram-nos sobrecarregados em impostos e sem incentivos à profissão", refere.
Defende por exemplo "que se eliminasse o IVA na mão-de-obra. Já não digo da fazenda, mas pelo menos da mão-de-obra". Por outro lado, "um aprendiz leva 10 anos para aprender o ofício e há pelo menos três ou quatro, no início, em que não rende. Devia haver incentivos a quem os acolhe nesta fase".

“Transformam um corpo mal feito numa obra de arte”
Carlos Godinho lamenta que já hoje o cenário seja de "haver cidades sem alfaite". "Daqui a uns anos, temos que fazer o mesmo que os Estados Unidos da América, que levaram italianos, gregos e portugueses para lá, porque ficaram sem alfaiates. Conheci alguns, da Guarda, que não hesitarem em aceitar as ofertas, porque tinham viagem e casa paga", descreve.
"Se me perguntarem se hoje ainda há razões para haver alfaiates, eu pergunto se ainda há razões para um homem querer andar elegante, bem vestido, com um fato a cair bem", responde. "Os políticos que o digam: vestem todos em alfaites", refere. Já para não falar de quem nem encontra tamanhos que lhe sirvam no pronto-a-vestir. "Os alfaites transformam um corpo mal feito numa obra de arte", garante.

O Encontro Nacional de Mestres Alfaiates realiza-se anualmente no último domingo de Maio, dia do padroeiro, "o Santo Homem Bom, de Itália, uma tradição que foi trazida para Portugal". Segundo Carlos Godinho, que organizou também o encontro do último ano, em Viseu, “há cerca de 60 inscrições para domingo". "São poucas porque o negócio está fraco e os combustíveis subiram muito", justifica.
A concentração está marcada para as 9h00 no Largo do castelo de Belmonte, com visitas ao património local, seguidas de um almoço-convívio pelas 13h30 e encerramento previsto para as 17h00.

in "Diário XXI"

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