domingo, 21 de junho de 2009

Infracções ambientais geram multas a três empresas

Enquanto o Governo não reduz as multas no regime das contra-ordenações ambientais, o Ministério do Ambiente está a mostrar uma inédita mão pesada. Este ano, já três empresas receberam 'facturas' de mais de meio milhão por infracções ambientais, mas com contornos surrealistas. Uma dessas empresas tem capitais públicos das Águas de Portugal, tutelada por Nunes Correia; outra pertence à Misericórdia e autarquia de Belmonte, que estava a desenvolver um projecto supostamente ecológico. A terceira é uma produtora de compressas.

Três multas acima de meio milhão de euros foram já aplicadas este ano pelo Ministério do Ambiente por desrespeito a normas das leis da água e dos resíduos. Os montantes extraordinariamente elevados decorrem do regime de contra-ordenações ambientais de 2006, que o Governo quer agora alterar por considerar porem em causa a sobre- vivência das empresas em época de crise e para desentupir os tribunais de processos de impugnação judicial.

De acordo com dados do Ministério do Ambiente a que o DN teve acesso, este ano constam 51 multas com valores superiores a 25 mil euros, situação incomum antes da entrada em vigor do regime de 2006.

Por exemplo, até 2003 apenas uma empresa tinha sofrida uma multa acima deste patamar. No top 10 deste ano constam multas a empresas com montantes que superam os 62,1 mil euros - ou seja, caem no espectro das infracções consideradas 'muito graves' e mesmo com dolo.

No topo desta 'lista negra' está a multa imposta a uma pequena empresa que, por ironia, até desenvolve um projecto de cariz ambiental: a Ecoldiesel.
Criada há cerca de quatro anos pela Santa Casa da Misericórdia de Belmonte e também com capitais da EMPDES (uma empresa municipal), a Ecoldiesel pretendia recolher e regenerar óleos de frituras em mais de mil estabelecimentos de restauração para produzir entre dois e três mil litros de biodiesel por dia.

Contudo, os serviços de inspecção ambiental detectaram faltas de licenciamento e de registo, bem como violações 'muito graves' na descarga de efluentes. E, sem misericórdia, aplicaram uma multa geral de 557,1 mil euros.

Em 2005, o presidente da empresa municipal de Belmonte, João Gaspar, justificava a entrada de capitais autárquicos na Ecoldiesel "por se tratar de uma indústria inovadora e limpa".

Em todo o caso, este ano a empresa que lidera no montante total de multas ambientais é a Recilis - uma empresa criada há poucos anos com o objectivo de resolver, em definitivo, o grave problema dos esgotos das suiniculturas da região de Leiria, que tem massacrado as populações locais, sobretudo em redor da famosa ribeira dos Milagres. Se durante anos a mão pesada do Ministério do Ambiente não se fez sentir, agora já se aplicaram duas multas. A primeira no valor de 60,1 mil euros; a segunda de 500,1 mil euros, neste caso não cumprir as normas exigidas para o tratamento das águas residuais por parte do Ministério do Ambiente.

Contudo, curiosamente, estas multas sucedem pouco tempo depois do anúncio da entrada da empresa Águas de Portugal, com uma quota de 40%, no capital da Recilis. Ou seja, o Ministério liderado por Nunes Correia acaba por multar a Recilis que detém capitais públicos de uma empresa por si tutelada.

A terceira multa acima do meio milhão de euros foi aplicada à Albino Dias de Andrade Lda, uma empresa de Paços de Ferreira, que produz compressas hospitalares, por incumprimento 'muito grave' das normas de descarga de águas residuais.

Com uma multa superior a 100 mil euros foi sancionada a Ega, uma empresa tipográfica de Loulé. Todos estes processos encontram-se em impugnação judicial ou as empresas ainda não foram formalmente notificadas ou ainda não expirou o prazo para recurso nos tribunais.

Estas multas são, porém, a ponta do icebergue das infracções em matéria ambiental. Só este ano, até Abril, o Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) da GNR, a principal entidade fiscalizadora, instaurou 5.233 processos de contra-ordenação, a que acrescem 534 crimes de natureza ambiental (ver caixa). Francisco Ferreira, dirigente da Quercus, que desconhecia a aplicação de multas tão pesadas, considera que "o regime de contra-ordenações está desajustado da realidade". "Criticámos os argumentos invocados pelo Governo para reduzir os montantes máximos das multas por darem um sentido errado, de se pode continuar a poluir."

Para este ambientalista, as contra-ordenações deveriam "separar o que é uma poluição persistente e muito grave, como sucede com os esgotos das suiniculturas ou de uma grande empresa, de um caso como o de Belmonte".

De acordo com Francisco Ferreira, "seria mais adequado impor o fecho de uma empresa que, de forma notória, não têm viabilidade ambiental do que estar a aplicar-lhe uma multa que jamais terá capacidade para pagar".


in "JN"

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