Viviam em Rio de Mouro, uma das mais populosas freguesias de Sintra, num prédio com sete andares onde não falavam com ninguém. Há quatro anos mudaram-se para uma casa de granito num lugarejo mais pequeno do que uma aldeia, sem nome na rua, nem número na porta. Não é preciso. Em Apeadeiro de Maçainhas, esquecido atrás da Serra da Estrela, não há quem não conheça "o casal que veio de Lisboa".
Hoje, Carla Pais, de 35 anos, garante quase nem se lembrar de algum dia ter tido outra vida. Começa a apagar-se da memória o medo que tinha de sair à rua de noite, o espaço que faltava no apertado T2 e o stresse que lhe consumia os dias e esgotava o tempo que nunca sobrava. Dessa altura já só tem pequenos relances, como quando ouve na rádio as informações do trânsito. Sempre que dizem que "o IC19 está compacto, com longos quilómetros de filas paradas", brilham-lhe os grandes olhos verdes e sorri. Ela que agora chama "hora de ponta" a três carros parados no semáforo.
"É como se estivesse no paraíso, em total paz de espírito e sem precisar de nada. Parece que vivi aqui toda a minha vida", diz. Quem a ouve, com tamanha alegria e entusiasmo, falar da opção que tomou com o marido pode achar que tudo foram facilidades. Mas a decisão foi radical e arriscada. Carla despediu-se da empresa onde trabalhava como administrativa e esteve dois anos sem conseguir arranjar novo trabalho quando se mudou para o concelho de Belmonte, em plena Beira Interior. Carlos teve de vender ao sócio a quota que tinha numa empresa de comercialização de congelados e hoje trabalha como metalúrgico numa fábrica.
Os ordenados baixaram, mas o custo de vida também. André, o filho de 8 anos, nunca mais teve uma constipação, quando em Rio de Mouro tinha de ser internado quase todos os meses com problemas respiratórios e bronquiolites provocadas pela humidade e poluição. E arranjaram espaço, muito espaço. Quase 7 mil metros quadrados de terreno, com uma vista deslumbrante para os picos ainda brancos da serra, onde plantaram relva e flores e o miúdo se delicia a brincar com os cães que sempre quis, mas nunca antes tinha podido ter. Atrás de Carla foi a irmã, o marido e as filhas, que também optaram por fazer as malas e rumar à pacatez do Interior.
A qualidade de vida numa terra pequena onde "é mais seguro e saudável educar as crianças" e onde a vizinhança "é calorosa e tem tempo para dizer bom-dia e boa-tarde" tem levado muitos outros a tomar a mesma decisão. Os vários incentivos dados pela autarquia para fixar população fazem o resto. Certo é que Belmonte é, a par da Guarda, o único concelho de toda a Beira Interior a ganhar habitantes. Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), registaram-se 143 novos belmontinos entre 2001 e o final de 2007. Um aumento de quase 1,9% conseguido graças a pessoas de outras terras que ali escolheram viver. Parece pouco, mas é uma verdadeira proeza, sobretudo tendo em conta que os concelhos vizinhos não param de ver gente partir.
Hoje, Carla Pais, de 35 anos, garante quase nem se lembrar de algum dia ter tido outra vida. Começa a apagar-se da memória o medo que tinha de sair à rua de noite, o espaço que faltava no apertado T2 e o stresse que lhe consumia os dias e esgotava o tempo que nunca sobrava. Dessa altura já só tem pequenos relances, como quando ouve na rádio as informações do trânsito. Sempre que dizem que "o IC19 está compacto, com longos quilómetros de filas paradas", brilham-lhe os grandes olhos verdes e sorri. Ela que agora chama "hora de ponta" a três carros parados no semáforo.
"É como se estivesse no paraíso, em total paz de espírito e sem precisar de nada. Parece que vivi aqui toda a minha vida", diz. Quem a ouve, com tamanha alegria e entusiasmo, falar da opção que tomou com o marido pode achar que tudo foram facilidades. Mas a decisão foi radical e arriscada. Carla despediu-se da empresa onde trabalhava como administrativa e esteve dois anos sem conseguir arranjar novo trabalho quando se mudou para o concelho de Belmonte, em plena Beira Interior. Carlos teve de vender ao sócio a quota que tinha numa empresa de comercialização de congelados e hoje trabalha como metalúrgico numa fábrica.
Os ordenados baixaram, mas o custo de vida também. André, o filho de 8 anos, nunca mais teve uma constipação, quando em Rio de Mouro tinha de ser internado quase todos os meses com problemas respiratórios e bronquiolites provocadas pela humidade e poluição. E arranjaram espaço, muito espaço. Quase 7 mil metros quadrados de terreno, com uma vista deslumbrante para os picos ainda brancos da serra, onde plantaram relva e flores e o miúdo se delicia a brincar com os cães que sempre quis, mas nunca antes tinha podido ter. Atrás de Carla foi a irmã, o marido e as filhas, que também optaram por fazer as malas e rumar à pacatez do Interior.
A qualidade de vida numa terra pequena onde "é mais seguro e saudável educar as crianças" e onde a vizinhança "é calorosa e tem tempo para dizer bom-dia e boa-tarde" tem levado muitos outros a tomar a mesma decisão. Os vários incentivos dados pela autarquia para fixar população fazem o resto. Certo é que Belmonte é, a par da Guarda, o único concelho de toda a Beira Interior a ganhar habitantes. Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), registaram-se 143 novos belmontinos entre 2001 e o final de 2007. Um aumento de quase 1,9% conseguido graças a pessoas de outras terras que ali escolheram viver. Parece pouco, mas é uma verdadeira proeza, sobretudo tendo em conta que os concelhos vizinhos não param de ver gente partir.
Em Lisboa não se vive
A mudança permitiu a Paula poupar mais de 400 euros por mês. Hoje a guia turística garante que já não troca a “vila dos judeus” por nada
António Pedro Ferreira
"Temos crescido de há uns tempos para cá, ao contrário do que acontece com o resto dos municípios das Beiras, mesmo os grandes como o Fundão, a Covilhã ou Castelo Branco. Belmonte é uma espécie de oásis no deserto", regozija-se Amândio Melo, presidente da Câmara desde 2001.
Isenção de taxas municipais, redução do IRS em 5%, comparticipação de creches, subsídios à natalidade ou majoração do abono de família são algumas das medidas lançadas para combater a desertificação. No total, custam quase um milhão de euros ao já magro orçamento da autarquia. Mas fazem com que seja muito mais barato viver ali. E isso pode ser decisivo.
"Começamos agora a ver resultados destes incentivos. Havendo dúvidas, as pessoas acabam por optar pelo sítio onde pagam menos e onde vivem melhor", resume o autarca. Foi o que aconteceu com Ana e Manuel Francisco, um casal de enfermeiros que há pouco mais de seis meses trocou os grandes hospitais lisboetas pelo pequeno centro de saúde de Belmonte.
Em Odivelas, nos subúrbios da capital, pagavam quase ¤500 por um T2. Em Belmonte um T3 custa-lhes €160. Com o ATL do filho de 3 anos comparticipado pela autarquia, a gasolina que deixaram de gastar ou a diferença no preço de bens essenciais, a mudança permitiu-lhes um desafogo económico que nunca antes tinham conhecido.
"Em Lisboa não se vive, sobrevive-se. Lá éramos mais uma família endividada. Agora o dinheiro não só chega até ao fim do mês, como ainda sobra. Até estamos a pensar ter um segundo filho, coisa que antes era impensável", conta a enfermeira, de 38 anos.
Mas nem todos os novos habitantes vieram de tão longe. O saldo positivo do concelho nas estatísticas demográficas consegue-se também com os jovens da terra que partiram para fazer a universidade nas grandes cidades e, ao contrário do que acontecia, agora optam por regressar, já de diploma na mão. E também com moradores dos concelhos vizinhos que fizeram contas à poupança e não hesitaram em mudar-se. Para Paula Carvalho, de 39 anos, a matemática foi muito simples: trocar a Covilhã, uma das mais desenvolvidas cidades da Beira, pela pequena vila de Belmonte, conhecida por albergar uma das maiores comunidades judaicas do país, rendeu-lhe mais de 400 euros por mês.
"O bairro onde eu vivia tinha mais eleitores do que o concelho de Belmonte todo junto. Mas aqui é tudo muito mais barato e, sobretudo, vive-se melhor. Não há stresse, não há carros a apitar e as pessoas não são robôs. Ainda têm afectos e prazer de cumprimentar. Podem chamar-me provinciana ou sopeira, mas já não troco isto por nada", jura.
A mudança permitiu a Paula poupar mais de 400 euros por mês. Hoje a guia turística garante que já não troca a “vila dos judeus” por nada
António Pedro Ferreira
"Temos crescido de há uns tempos para cá, ao contrário do que acontece com o resto dos municípios das Beiras, mesmo os grandes como o Fundão, a Covilhã ou Castelo Branco. Belmonte é uma espécie de oásis no deserto", regozija-se Amândio Melo, presidente da Câmara desde 2001.
Isenção de taxas municipais, redução do IRS em 5%, comparticipação de creches, subsídios à natalidade ou majoração do abono de família são algumas das medidas lançadas para combater a desertificação. No total, custam quase um milhão de euros ao já magro orçamento da autarquia. Mas fazem com que seja muito mais barato viver ali. E isso pode ser decisivo.
"Começamos agora a ver resultados destes incentivos. Havendo dúvidas, as pessoas acabam por optar pelo sítio onde pagam menos e onde vivem melhor", resume o autarca. Foi o que aconteceu com Ana e Manuel Francisco, um casal de enfermeiros que há pouco mais de seis meses trocou os grandes hospitais lisboetas pelo pequeno centro de saúde de Belmonte.
Em Odivelas, nos subúrbios da capital, pagavam quase ¤500 por um T2. Em Belmonte um T3 custa-lhes €160. Com o ATL do filho de 3 anos comparticipado pela autarquia, a gasolina que deixaram de gastar ou a diferença no preço de bens essenciais, a mudança permitiu-lhes um desafogo económico que nunca antes tinham conhecido.
"Em Lisboa não se vive, sobrevive-se. Lá éramos mais uma família endividada. Agora o dinheiro não só chega até ao fim do mês, como ainda sobra. Até estamos a pensar ter um segundo filho, coisa que antes era impensável", conta a enfermeira, de 38 anos.
Mas nem todos os novos habitantes vieram de tão longe. O saldo positivo do concelho nas estatísticas demográficas consegue-se também com os jovens da terra que partiram para fazer a universidade nas grandes cidades e, ao contrário do que acontecia, agora optam por regressar, já de diploma na mão. E também com moradores dos concelhos vizinhos que fizeram contas à poupança e não hesitaram em mudar-se. Para Paula Carvalho, de 39 anos, a matemática foi muito simples: trocar a Covilhã, uma das mais desenvolvidas cidades da Beira, pela pequena vila de Belmonte, conhecida por albergar uma das maiores comunidades judaicas do país, rendeu-lhe mais de 400 euros por mês.
"O bairro onde eu vivia tinha mais eleitores do que o concelho de Belmonte todo junto. Mas aqui é tudo muito mais barato e, sobretudo, vive-se melhor. Não há stresse, não há carros a apitar e as pessoas não são robôs. Ainda têm afectos e prazer de cumprimentar. Podem chamar-me provinciana ou sopeira, mas já não troco isto por nada", jura.
in "Expresso"
2 comentários:
Realmente que é e será uma maravilha morar em Belmonte, porque não á carros a apitar porque tambem as pessoas não têm pressa para irem trabalhar porque empregos não há, não a stress porque as pessoas estão confortaveis em casa a receber do estado, assim realmente é maravilhoso para quem ainda tem um posto de trabalho, mas ainda me lembro do tempo em que as pessoas andavam sempre á corrida para irem para as empresas que hoje estão fechadas ou reduziram os funcionarios, para trabalharem a seguir tinham que ir buscar os filhos as escolas,fazer compras, tratarem da casa e preparar tudo para no dia seguinte logo de manha sedo começar novamente a corrida, nessa altura havia horas em que Belmonte parecia uma cidade, com carros em movimento autocarros lotados, pessoas a pé tudo girava, até em tempos mesmo nas povoaçoes limitrofes ao concelho se deslocavam a Belmonte para se abastecerem porque havia dinheiro e de tudo se vendia, enfim era uma vila VIVA!!! agora tirando algum turismo e algumas pequenas empresas que teimam em tentar sobreviver, o que há em Belmonte?
E á de salientar que há novos habitantes que apenas estão a voltar as origens, porque nas grandes cidades que em tempos tinham excolhido para fazer vida, hoje em dia tambem não está facil e alguns perderam os empregos outros estavam no mesmo rumo e então mal por mal vamos para a nossa terra que ainda lá estão os velhotes a receberem as suas reformas e a cultivarem as suas terras para os poderem ajudar e finalmente haverá sim um caso ou outro em que realmente acontece o contrario e quando começar a haver mais gente a apostar em Belmonte daqui a 60 anos talves os netos escolham um outro lugar para morar e livrarem-se do stress e dos carros a apitar em Belmonte... e depois qual sera a noticia deste blog se ainda existir?
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